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Comércio de dados: como nossos dados estão sendo vendidos e usados pelas empresas.

Quantas vezes você ouviu alguém dizer que “os dados são o novo petróleo”? Desde que a famosa matéria de capa da The Economist saiu lá em 2017 (5 anos que parecem décadas), todo palestrante que sobe no palco de um evento usa esta expressão para se referir à importância dos dados para a economia digital. 

A retórica de palco sobre dados está cada vez mais virando realidade. A Shanghai Data Exchange é uma corretora de dados que vende informações como se fosse uma commodity. Os dados comercializados incluem empresas como China Eastern Airlines, China Mobile, China Unicom e China Telecom. No site da empresa (em Chinês), é possível ter acesso a conteúdos e atualizações sobre os fornecedores de dados e todo processo de compra e venda. 

Data Exchange

Não há dúvidas que isso é positivo para o mercado de tecnologia local. Porém, as questões éticas sobre privacidade sempre estarão presentes nesse debate. 

Não é um negócio só da China.

Em um mundo cada vez mais globalizado, os negócios da China estão por todo ocidente no dia seguinte. Corretores de Dados (ou “Data Broker” se você for falar sobre isso ali pela região da Av. Faria Lima) como a SafeGraph estão comercializando dados de localização de pessoas que foram em clínicas de aborto nos EUA. Grupos antiaborto são ultra-conservadores, mas já são bastante adeptos do uso de novas tecnologias. Em 2016, mulheres sentadas em clínicas da Planned Parenthood receberam publicidade com mensagens antiaborto na tentativa de mudar sua decisão sobre fazer o procedimento. Antes que vocês decidam jogar o celular na máquina de lavar roupa, é importante avisar que as empresas alegam “anonimizar” os seus dados antes de vendê-los. Aparentemente, está tudo dentro das leis de proteção de dados. Enfim, mais uma pauta para a infinita discussão sobre ética no uso de dados em publicidade programática. 

O outro lado da moeda.

O uso de dados pessoais não é só uma fonte de renda para corretores de dados e performance de vendas para anunciantes. Também serve para prevenir fraudes. A Netflix anunciou que vai passar a cobrar dos usuários que compartilham seu login com familiares e amigos. Sim, isso é uma quebra de contrato (que ninguém lê). O detalhe é que uma das informações usadas para detectar que um login foi compartilhado é o endereço IP de onde o aparelho está logado. Se você leu por cima a LGPD, já vai saber que o endereço IP é considerado um dado pessoal. E não adianta processar o Netflix por isso, já que no contrato nós damos consentimento para o uso desse dado. 

Escondendo seus dados como uma avestruz.

Particularmente, eu acredito que nada desaparece da internet. Sempre vai ter um servidor, um HD ou um pen drive com aquilo que você queria esconder do mundo. O Internet Archive é uma prova disso e é muito usado para resgatar Tweets apagados. Porém, uma empresa fundada por ex-militares isralenses, especializados em cibersegurança, está prometendo apagar seu rastro de dados da internet. Eles alegam usar a mesma tecnologia que o exército usa para rastrear dados, mas com o efeito inverso: apagar toda sujeira que deixamos pelo caminho. O ícone da empresa é uma avestruz que se satisfaz em esconder a cabeça em um buraco para ocultar sua presença dos predadores. 

Ainda vamos passar muito tempo discutindo sobre uso de dados, legislação e ética na transformação que estamos vivendo na economia digital. Toda empresa hoje precisa atuar com responsabilidade, para não só ficar dentro da lei, mas também respeitar as decisões dos seus clientes em relação às informações pessoais e sensíveis.