O processo de vendas é algo que está ficando cada vez mais sofisticado por conta da tecnologia. Metodologias, técnicas e ferramentas trazem cada vez mais camadas para este processo de separar as pessoas do seu dinheiro em troca de algum produto ou serviço.
Estava pensando em escrever este artigo sobre funil de vendas e fui pesquisar as origens dessa metodologia. Fiquei espantado em saber que esse cone invertido com etapas de descoberta, intenção de compra e conversão tem mais de 100 anos. Quando olhamos os modelos novos de funil de vendas, percebemos que muitos apenas agregaram etapas ou uma visão de recorrência.
O funil AARRR, que é muito difundido entre os profissionais de growth, traz essa visão de recorrência. Trata-se de uma atualização para um modelo mais adequado da economia digital onde se busca que um cliente siga consumindo ou renovando suas compras.
Não faz muito tempo, a Hubspot trouxe a ideia do funil flywheel, que na verdade não é um funil, mas um círculo. Essas duas visões de jornada de vendas buscam mostrar que a etapa pós-venda também faz parte da geração de receita. Customer success entra para o jogo como parte da equipe de vendas.
Recentemente, também em busca de uma visão mais didática de como a recorrência precisa ser trabalhada como uma área de geração de receita, surgiu o funil espelhado. Temos mais etapas, logo, mais detalhamento e especificidade do processo.
Esse funil espelhado tem sido bastante adotado pois parece fazer mais sentido para as empresas e processo de quem executa as etapas. Essa visão ganhou ainda mais detalhamento através do Winnig By Design. Etapas e cargos foram divididos e especificados por tamanho de cliente e métricas de crescimento.
A prática derruba a teoria no primeiro contato.
Essas visões de jornada de vendas são todas válidas e muito úteis para orientar equipes e gestores em busca de um modelo de vendas recorrentes. Porém recentemente lendo alguns livros sobre novos modelo de máquina de vendas, entendi porque estas teorias encontram barreiras operacionais na prática. O funil de vendas tradicional ou espelhado ou o Flywheel funcionam perfeitamente nas condições tradicionais de vendas. São adaptações do modelo analógico para a economia digital, onde a comunicação de marca e a experiência de compra tinham menos recursos e variações. Mas a jornada de consumo hoje não é tão perfeita e ordenada em fases que se complementam numa sequência lógica.
Vou trazer um exemplo que tive no processo de aquisição de software CRM. Quando estava em busca de uma solução, eu fiz uma pesquisa rápida com colegas e em artigos na internet. Logo percebi que existem muitas soluções disponíveis e que todas pareciam ter vantagens competitivas muito semelhantes. Então, eu fiz o que a maioria das pessoas acabam fazendo: testei 3 ou 4 opções que ofereciam trials ou até modelo freemium. Na teoria, eu comecei pelo fundo do funil.
Depois de apertar alguns botões e olhar a interface de cada plataforma, eu fui me aprofundar sobre o tipo de empresa e quais funcionalidades cada marca tinha como vantagem. Significa que eu voltei para o meio do funil buscando compreender melhor cada solução.
Durante esse processo, os algoritmos do Facebook entenderam que eu estava em busca de uma solução de CRM. Assim, recebi publicidade de uma das marcas que eu estava testando que me levou a um artigo muito interessante sobre como aquele software resolve exatamente o problema que eu tinha como prioridade. Ou seja, eu retrocedi (ou avancei?) para o topo do funil.
A minha quarta etapa dentro do funil de aquisição foi a comparação de preços. A solução que parecia mais adequada era ligeiramente mais cara do que uma outra que eu tinha gostado mais da interface e usabilidade. Voltei para o meio do funil.
No meio desse processo todo, acabamos postergando a troca do CRM. Meses depois, eu tive que buscar os nomes das duas finalistas no Google e cliquei em anúncios de cada uma. Olha lá eu perdido no meio do funil! Para o pessoal do marketing digital a minha conversão na plataforma escolhida acabou sendo definida como anúncio no buscador (como acontece com a maioria das vendas hoje em dia).
Esse processo errático de compra acaba bagunçando a teoria organizada e fluida do funil de vendas linear, seja com a forma de uma gravata borboleta ou um círculo. A jornada de compra do usuário, seja B2B ou B2C, é cada vez mais difícil de prever e controlar. Primeiro porque o consumidor está se acostumando a se auto educar sobre os produtos e serviços que deseja. Se a marca não consegue dominar esse processo de educação, já perde relevância pelo caminho. E, segundo, porque a experiência do produto cada vez mais conta na decisão de compra. O consumidor sai testando tudo que pode nesse processo de auto-educação. Isso significa que boa parte do processo de venda acontece após a aquisição do consumidor como usuário da experiência. Isso serve para o ambiente digital, mas também para o ambiente físico. A loja física “adquire” o cliente assim que ele entra pela porta.
Pensar na jornada de compra ao invés da jornada de venda.
Acredito que todos estes modelos contribuem muito para organizar processos e times. Unicórnios nasceram baseados nestes modelos de funil de vendas! Porém estes modelos ainda orientam mais o processo de venda do que o processo de compra, como o meu exemplo da aquisição do software CRM.
Um modelo que representa melhor este processo onde o poder de decisão está totalmente nas mãos do consumidor é este do livro Blueprints for a SaaS Sales Organization: How to Design, Build and Scale a Customer-Centric Sales Organization:
Levar em consideração o tempo dedicado em cada etapa do processo ajuda a modelar melhor os recursos e esforços em cada etapa. O momento de educação muitas vezes recebe menos recursos de conteúdo do que o momento de descoberta. Afinal, o desenho da boca do funil tradicional é maior do que o resto. O momento de expansão também é outro que recebe pouca atenção, quando a área de Customer Success não é considerada como parte do time de receita.
Outro ponto importante que este modelo de jornada de compra ataca é a integração de dados com clientes entrando de forma desordenada. Geralmente os softwares são integrados de forma linear, conforme a direção do funil. Por isso, a integração de dados precisa prever esses movimentos em todas as direções.
Como é o funil da experiência?
Os modelos de aquisição de clientes na era digital estão cada vez mais apontando para entrega de valor o mais rápido possível. A busca por apropriação de dados torna o trabalho muito mais fácil quando o prospect entra para a propriedade da empresa. Assim, reduz a “recompra” de leads, conforme já mencionei neste artigo.
O Wes Bush, autor do livro Product-led Growth, propõe essa visão: à esquerda o modelo tradicional e, à direita, o modelo baseado na entrega de experiência o mais rápido possível.
O que este modelo não mostra é o que acontece após a integração. Cada produto tem características específicas e únicas. O que impede ter um modelo fixo de jornada. É preciso desenvolver novos conceitos de conversão de clientes e aplicar lá dentro. É o desafio para quem pretende evoluir seu funil de vendas.