Ter mulheres na liderança das empresas não é só uma questão de igualdade de gênero. É fundamental para o desempenho.
As lideranças femininas foram grandes afirmações desta pandemia. Desde os primeiros meses de 2020, tivemos provas e mais provas de que as mulheres têm uma habilidade superior à dos homens para conduzir a transformação necessária que a sociedade e o ambiente externo demandam daqui para frente.
A afirmação das mulheres nas posições de liderança já era pauta de estudos e pesquisas que traziam dados concretos sobre resultados obtidos tanto no ambiente corporativo como na política. O ano de 2020 nos mostrou que empresas e países liderados por mulheres foram capazes de superar o momento de forma mais colaborativa e com melhores resultados na comparação com seus equivalentes masculinos. A comparação é inevitável mesmo quando se trata de realidades incomparáveis: as mulheres têm maior responsabilidade e tarefas relacionadas aos filhos e à casa mesmo quando elas são diretoras, presidentes e primeiras-ministras.
Liderança não é um cargo. Mas sim uma construção baseada em atitudes e reputação. Não é algo que um diploma ou certificado pode garantir que você está apto a ser um ou uma líder. Essa habilidade está cercada de subjetividades que a literatura de auto-ajuda e os coaches (na sua maioria homens) buscam desvendar e ensinar (em geral para outros homens) aplicando engenharia reversa de cases bem-sucedidos (na maioria das vezes de mais homens). O problema está justamente nestes parênteses da frase anterior. É muito homem tentando explicar porque homens são bons líderes para que outros homens tentem ser bons líderes. E aqui neste teclado tem mais um homem tentando explicar isso para você que lê este texto. Bom, pelo menos eu já parto do princípio que estou me arriscando bastante ao narrar o ponto de vista feminino. Convido a seguir a leitura, pois como já dizia a letra do grande Pepeu Gomes, “Ser um homem feminino / Não fere o meu lado masculino”.
O que faz das mulheres mais aptas para influenciar e ganhar a confiança das pessoas? Por que elas são mais hábeis para motivar a colaboração e engajamento dos times para cumprirem um objetivo específico? A verdade é que as mulheres sempre foram muito aptas à liderança. No Brasil, milhões de mães lideram lares sem a presença ativa de um pai. Milhões de empreendedoras sustentam suas famílias e geram oportunidades para outras pessoas. Elas já eram o porto seguro e sustento de muitos há muito tempo. Acredito que o momento de crise humanitária que vivemos na pandemia evidenciou de forma mais concreta o argumento das demandas pela igualdade de gênero no ambiente profissional e político.
Do ponto de vista corporativo, estamos evoluindo de um modelo mecanicista de gestão, baseado em habilidades técnicas (hard skills), para um modelo baseado em propósito e cultura, que é calcado em habilidades subjetivas (soft skills). Para entender essa mudança de era que vivemos na gestão, recomendo a leitura do livro Reinventando as Organizações, do Frederic Laloux. No modelo mecanicista, as pessoas são comparadas a peças de uma engrenagem. Cada peça, no seu devido lugar, pode ascender e liderar pelo cargo a partir da sua evolução técnica. A motivação do modelo mecanicista é por maiores resultados e crescimento sem limites. Já no modelo pluralista, a busca pelo consenso, equilíbrio e harmonia levam a um melhor resultado e crescimento sustentado por um propósito comum. A diferença entre maiores resultados por melhores resultados é crucial para revelar a capacidade de liderança feminina.
Durante muitos anos, as mulheres sempre tiveram que provar muito mais suas habilidades técnicas para lutar por um lugar nas posições de liderança, uma vez que essa era a premissa para garantir ascensão por cargos. As hard skills são habilidades mais fáceis de mensurar, como fluência em um idioma ou capacidade de usar uma ferramenta. Quanto mais você evolui tecnicamente, mais útil você é na condição de peça da engrenagem que gera resultado.
Agora, parece que o jogo virou. As tais soft skills são habilidades inatas a todos, mas que qualquer ser humano é capaz de desenvolver e treinar para evoluir. São habilidades que evoluíram com a espécie humana. Só que foram mais exigidas nas mulheres desde o tempo em que saímos das cavernas para formar as primeiras civilizações. Isso mesmo: as mulheres têm 10 mil anos de civilização de vantagem em relação aos homens. Que essa informação sirva de motivação para você se esforçar mais caso seja homem.
Esta liderança observada no ambiente empresarial é fruto de questões sociais, mas também de um questionamento sobre a capacidade do planeta sustentar o crescimento sem limites da era mecanicista. Tecnicamente, o modelo que nos trouxe até aqui está causando uma série de problemas irreversíveis como aquecimento global, extinção de espécies, doenças cada vez mais complexas de controlar entre outras consequências do modelo exploratório sem limites, que não visa o equilíbrio entre a espécie humana e o resto do planeta.
O famoso best seller Inteligência Emocional do Daniel Goleman fala de forma mais técnica sobre estas habilidades (fica a dica de ler bastante para buscar estes 10 mil anos de handicap).
Deixo aqui algumas soft skills que entendo serem a base da liderança:
Escuta ativa: Levar em consideração o que o outro diz é uma habilidade que aproxima as pessoas e promove a colaboração. É diferente de apenas permitir a pessoa falar. Escuta ativa não é uma concessão do chefe, mas uma troca verdadeira de ponto-de-vista.
Comunicação: Quem escuta bem sabe se comunicar melhor. A capacidade de contagiar as pessoas com suas ideias e visão de futuro é fundamental para liderar. E essa conexão se inicia ao conectar sua visão de futuro com a visão dos outros.
Empatia: Esta é uma habilidade bastante subjetiva, pois depende da capacidade de sentir o que o outro sente para se solidarizar. É uma das mais difíceis de adquirir pelo aprendizado formal. Pessoas que passam por experiências em culturas muito diferentes podem se desenvolver mais neste aspecto.
Espírito de equipe: O verdadeiro espírito de equipe se manifesta quando as pessoas entendem o papel de cada um e colaboram para que todos dêem o seu melhor em prol de um objetivo comum. A liderança está em mostrar que o concorrente está fora do grupo e não entre os pares lutando por um cargo mais algo para virar chefe do outro.
Resolução de conflitos: No modelo pluralista de organização, os conflitos e debates são a base da evolução para o propósito. Quanto mais debates, mais as pessoas se motivam, pois sentem que estão mais próximas do melhor resultado para todos.
Resiliência: Existem duas formas de interpretar essa habilidade. A visão masculina tende a concluir que resiliência é a capacidade de aguentar muita porrada. Ou como já dizia um grande herói da minha infância, Rocky Balboa: “Não importa o quanto você bate, mas sim o quanto aguenta apanhar e continuar. É assim que se ganha.”. Mas prefiro ficar com a Luiza Helena Trajano que diz ““Empreendedorismo, para mim, é fazer acontecer, independentemente do cenário, das opiniões ou das estatísticas. É ousar, fazer diferente, correr riscos, acreditar no seu ideal e na sua missão.”. Enquanto Rocky se ocupa em apanhar, ela busca esquivar os golpes e ousar.
Estas são algumas das soft skills mais comuns às lideranças femininas. É possível encontrar muitas outras, inclusive, como consequência da combinação destas. A sociedade e o mundo só tem a se beneficiar com o equilíbrio na representatividade das lideranças em todos os ambientes. Não se trata só de igualdade. Está comprovado que mulheres na liderança geram melhores resultados. A visão pluralista feminina, que busca o equilíbrio, é fundamental para a mudança de era que estamos vivendo.